sábado, 9 de janeiro de 2016

EXCLUSIVO-Comitê do BC recomendou inabilitação de Esteves em 2010 por perdas no Pactual

Um comitê do Banco Central recomendou em 2010 que o banqueiro André Esteves, preso em novembro passado acusado de obstruir a operação Lava Jato, fosse impedido por seis anos de ter cargos de direção em instituições financeiras por irregularidades no antigo Pactual, mostra um documento do BC obtido pela Reuters.

A punição acabou sendo fixada anos mais tarde em multa, pelo entendimento por um diretor do BC de que a inabilitação seria um castigo excessivo ao ex-controlador e ex-presidente do BTG Pactual. Segundo o documento, o Comitê de Análise de Proposta de Decisão de Processos Administrativos Punitivos (Codep) do BC considerou Esteves responsável de "infração grave" pela produção de perdas "de forma deliberada" para o Pactual, de 2002 a 2004.
O caso envolveu operações de câmbio e juros na BM&F que beneficiaram a Romanche Investment Corporation LLC, constituída em Delaware, nos Estados Unidos. Não há informações públicas sobre quem são os donos da Romanche, que no Brasil era representada legalmente pelo Pactual.
A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) apontou, sobre o mesmo assunto em 2007, que a coincidência de perdas para o Pactual e de ganhos para a Romanche indicaria o suposto objetivo de reduzir impostos do banco no Brasil.
A apuração no BC não envolveu questões tributárias, que estão fora de suas atribuições, e ficou concentrada nas operações financeiras, equivalentes a quase 3,8 bilhões de dólares.
Além do impedimento de Esteves por seis anos, o comitê do BC sugeriu inabilitação de um ano para Paulo Fernando Carvalho de Oliveira, que foi diretor do Pactual responsável por decisões de investimento na BM&F e saiu da banco em 2009 com outros executivos para fundar a empresa de investimentos Vinci Partners. O Codep propôs, ainda, multa de 25 mil reais para o banco.
O diretor de Organização do Sistema Financeiro e Controle de Operações do Crédito Rural do BC, Sidnei Corrêa Marques, responsável pela palavra final em casos de inabilitação, solicitou em agosto de 2011 novas diligências sobre o processo.

Em abril de 2013, Marques determinou que, ao invés da inabilitação, Esteves e Oliveira arcassem com uma multa de 100 mil reais cada um, o valor máximo para casos dessa natureza à época. Ele também manteve multa de 25 mil reais ao banco. 
O diretor do BC apontou na ocasião que a conduta dos envolvidos não indicava "elementos de gravidade suficientes" para a inabilitação, e que as irregularidades não impactaram o resultado do banco, nem colocaram o Pactual em risco ou ameaçaram o sistema financeiro nacional.
Em entrevista à Reuters, o diretor do BC afirmou ter agido de forma compatível com as ocorrências. "Quando um banco é sistemicamente importante, está entre os dez maiores, tem importância no país, eu tenho que ver direitinho qual será minha decisão para não afastar dirigentes imprescindíveis para a instituição financeira", disse.
"É minha responsabilidade fazer essa avaliação mais abrangente dos impactos na instituição, se aquela pessoa realmente é fundamental, se não é fundamental. Por isso, a figura inabilitação está na mão do diretor (do BC), e não na mão do chefe nem do gerente técnico do departamento", completou.
Meses antes de o diretor do BC ter pedido análises adicionais sobre o processo envolvendo Esteves, o BTG Pactual anunciou a compra do Banco Panamericano, que quase quebrou após a descoberta de fraude em sua contabilidade.
Marques disse já ter contrariado o Codep em outros casos, ora por considerar as sugestões do comitê brandas demais ora por avaliá-las excessivas. Não há estatísticas quanto ao número de vezes em que o diretor do BC fez isso.
Desde 2011, quando a recomendação de impedimento de Esteves chegou a Marques, 1.430 profissionais foram inabilitados pelo BC. A autoridade escrutina quase 1.900 instituições financeiras no Brasil.
Procurados sobre o processo administrativo no BC, Esteves e Oliveira não se manifestaram.
O BTG Pactual, por meio de sua assessoria de imprensa, fez alusão ao formulário de referência do banco de 2013, no qual informa que aceitou as multas impostas pelo BC totalizando 225 mil reais à instituição e a "duas pessoas físicas acusadas", sem fazer citações nominais, "após análise cuidadosa de vários fatores".
O banco chegou a estimar que, se tivesse sido responsabilizado pelas supostas irregularidades, poderia ter recebido multa de até cerca de 189 milhões de dólares, o equivalente a 5 por cento das operações que motivaram o processo, com base em precedentes similares julgados pelo BC.
A Reuters não conseguiu localizar representantes da Romanche, que teve seu registro nos EUA cancelado no início de 2011, após renúncia de seu agente local. No registro brasileiro da Romanche na Receita Federal, o endereço da empresa remete a um escritório de advocacia em Delaware.
O BTG Pactual afirmou que nenhum sócio do antigo Pactual ou do banco atualmente foi investidor da Romanche.
PRESO NA LAVA JATO
Esteves, cuja imagem sempre esteve fortemente ligada à do banco, foi preso em 25 de novembro passado sob suspeita de obstruir a operação Lava Jato, que investiga um bilionário esquema de corrupção na Petrobras. O banqueiro, que nega as acusações, deixou em 18 de dezembro a penitenciária de Bangu 8, no Rio de Janeiro, para cumprir prisão domiciliar. Desde sua prisão, que não guarda nenhuma conexão com o processo administrativo no BC, o BTG Pactual viu uma queda de cerca de 50 por cento de seus papéis negociados na Bovespa.
Uma semana após Esteves ser detido, um grupo de sócios do banco assumiu o controle da instituição e iniciou a venda de ativos considerados não estratégicos para reforçar a liquidez, em meio à onda de saques por clientes.
LINHA DO TEMPO
Esteves protagonizou uma rápida ascensão no seleto clube de bilionários brasileiros, à frente de uma instituição que se tornou o maior banco de investimentos independente da América Latina.
Depois de iniciar a carreira no Pactual como analista de sistemas, Esteves, já com cargo de presidente, orquestrou a venda do banco em 2006 para o suíço UBS, do qual se desligou dois anos mais tarde para fundar o BTG. Em meio à crise financeira de 2009 e com o UBS procurando um comprador para o negócio no Brasil, Esteves arrematou o Pactual de volta, dando origem ao BTG Pactual.
Com Esteves ainda no UBS Pactual, em 2007, o banco e a Romanche firmaram um termo de compromisso com a CVM mediante pagamento de 8,1 milhões de reais, extinguindo processo sobre o mesmo caso que seria analisado posteriormente pelo BC.
Fonte: Reuters Por Marcela Ayres
(Reportagem adicional de Brad Haynes, em São Paulo; Edição de Cesar Bianconi)

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